Abissal

Café das sete
3 min readDec 31, 2023

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“As vezes minha vida seria bem mais simples se eu ficasse só na superfície, mas é tão gostoso mergulhar” — Marcela Ceribelli.

Passei o 2023 inteiro ouvindo a voz de Marcela, me encontrando nas feridas cancerianas que partilhamos e me desencontrando nas diferenças das nossas histórias de vida. Escutando essa frase dela hoje me lembrei de uma reflexão que tive na curta semana de férias que tirei e que eu tinha gravado um áudio, porque como de costume estava no volante. Outra coisa que passei o ano fazendo, tendo ideias e reflexões enquanto dirigia e as gravando em áudio pra escrever depois. Me ouvindo eu recordei, da relação que fiz entre o mar e a vida.

O mar uma imensidão de água que eu sinto fazer parte, como se eu fosse, ou melhor, porque sou, regida pela água. Parte de mim, mas que ao mesmo tempo me assusta. Porque olhar no espelho é mesmo assustador em alguns momentos. O mar: incerto, perigoso e difícil de encará-lo sozinha. A vida: incerta, perigosa e difícil de encará-la sozinha. Nessas férias eu tive a experiência de fazer uma aula de surf, que foi muito divertida e me trouxe muitas coisas pra pensar, em diferentes lugares. Mas, que principalmente me trouxe coragem. Estar no mar (ou na vida) com a professora (ou seja, acompanhada) me fez sentir as ondas e os medos mais suaves.

Eu cheguei pra aula quase desistindo (esse foi um sentimento constante durante o ano também), mas acreditando que eu deveria vencer aquele receio, como fiz ou não fiz outras vezes durante o ano. No mar, quando a onda vinha mais forte e a prancha quase voava, a professora preocupada perguntava se estava tudo bem. E eu, estava gargalhando e tendo crises de riso (segura). O mar, não parecia tão perigoso, incerto e difícil de encarar, porque naquele momento eu não estava sozinha.

Como é possível que com tantas amizades, a solidão ainda seja algo tão constante? Na última sessão de terapia, ora eu brincava de que faria um organograma pra minha terapeuta conseguir acompanhar as dinâmicas dos meus grupos de amigas (que tenho alguns), ora falava sobre me sentir sozinha. Contraditório. Eu sei, porque as contradições só acabam quando a gente morre! Mas, ela me questinou: porquê? E com um fim lacaniano (não foi um corte), mas sem respostas eu desci as escadas e fui pra casa de bike gastando minhas últimas unidades de energia daquele dia.

Rouca e feliz eu cheguei em casa e compartilhei com as amigas a felicidade de ter voltado pra casa de bicicleta. Eu tenho algumas teorias sobre a solidão latente e esse ano foi bem intenso nesse sentido, chegamos, eu e minha solidão bem próximas das crises de ansiedade. E que são as crises de ansiedade? Uma dose cavalar de solidão mal interpretada no instante presente? Porque ali naqueles minutos de dor e falta de ar, nada mais acontece do que uma confusão constante que só você enxerga?

Assim, parafraseando Marcela, eu queria ficar só na superficie algumas vezes, parece mais simples, mas mergulhar não só é gostoso, como é a unica forma que eu sei viver. E pro porquê da terapeuta eu escolhi não responder, mas tá tudo aí, é só reler.

Desejo um ano novo de sabedoria para que eu permance nas águas profundas e consiga fazer isso com simplicidade.

Desejo isso pra mim

e pra você.

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Café das sete

Por Helena Merlo. MUITOS erros de digitação pq eu escrevo na fritação do sentimento! CATARSE. "A arte é uma confissão de que a vida não basta" F.Pessoa